Temas de Educação
terça-feira, 18 de outubro de 2016
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quarta-feira, 21 de setembro de 2016
Para um Ensino Superior Relevante e Sustentável
José Ferreira Gomes
Faculdade de Ciências, Universidade do
Porto
Introdução
O tema é desenvolvido num formato muito
esquemático, procurando evidenciar os aspetos considerados mais importantes
para a problemática do ensino superior na atualidade. Com histórias muito
diversas, os problemas do ensino superior variam de país para país e de região
para região, mas pode identificar-se um fundo comum num mundo onde a
globalização é imparável. De privilégio de 1 a 5% dos jovens dos países então
mais desenvolvidos na primeira metade do século XX, o acesso ao ensino superior
é hoje a ambição da maioria dos jovens de quase todo o mundo. Em alguns países
é já uma realidade o acesso de mais de 50% das coortes jovens. Este crescimento
estatístico é, em parte, o resultado da maior abrangência do que é considerado
hoje ensino superior. Este tem vindo a incorporar progressivamente áreas de
formação que no passado eram relegadas para espaços de formação profissional.
Os casos mais bem conhecidos são a formação de professores e de profissionais
da saúde, as duas áreas de maior emprego, e de emprego público em países de
tradição de maior apoio social. É iniludível o facto de a passagem de 1% para
50% da população jovem transforma naturalmente a instituição de ensino
superior. Desaparece a forte seletividade intelectual (ou social) mas
transforma-se também nas áreas de conhecimento incluídas. Se o ensino superior
medieval pode ser visto como uma formação profissional muito centrada no
direito (canónico e civil), o século XIX quis centrar-se na busca do conhecimento
desinteressado e independente dos poderes, relegando a formação profissional
para segundo plano. A massificação dos últimos decénios veio obrigar a uma
atenção renovada ao cariz profissional do percurso educativo o que nem sempre
foi bem aceite pelos académicos mais tradicionais (e não é praticado em todas
as áreas). Ao trazermos a maioria da coorte jovem para o ensino superior somos
obrigados a diferenciar em termos disciplinares por reconhecermos que estes
estudantes vão desempenhar no futuro muitas atividades profissionais que no
passado (e no presente) não eram desempenhadas por diplomados; temos ainda de
diferenciar entre o percurso oferecido aos estudantes que buscam uma
profissionalização que lhes permita uma vida digna e os que têm uma maior
ambição intelectual, que têm por primeiro objetivo chegar ao limite do
conhecimento humano deixando para mais tarde outras preocupações. Esta dupla
diversificação é a chave do sucesso dos sistemas de ensino superior modernos,
mas está longe de ser conseguida na maioria dos países.
A apresentação dos aspetos considerados
mais relevantes faz-se da perspetiva de alguém que conhece bem o sistema de
ensino superior português e europeu e das américas. Alguém que acompanhou o
desenvolvimento rápido conseguido nos últimos poucos anos na Ásia e na África,
mas com um conhecimento limitado dos aspetos particulares de cada país. O
ensino superior, talvez mais do que outros setores de serviço público, tem
sempre uma enorme dependência da história do país e da região. As
generalizações entre países e entre regiões são arriscadas. Nos últimos anos,
vinga a preocupação de interlegibilidade dos sistemas de ensino superior de que
o processo de Bolonha é o exemplo mais bem conhecido. A mobilidade das pessoas
e das empresas assim o exige. Os jovens procuram um diploma que possam usar ao
longo de uma longa vida profissional e querem manter em aberto a possibilidade
de se deslocarem para outra região do mundo ou de virem a colaborar com
empresas dessas outras regiões. Há problemáticas que são cada vez mais comuns a
todos os países. Mas a busca de caminhos de definição de cada sistema de ensino
superior e da sua regulação mantém muitas características locais. O arquiteto
tem de ser local e conhecer bem esse sistema num contraste permanente com o que
são as melhores práticas internacionais. É em plena consciência destas
limitações que foram alinhavadas as notas esquemáticas seguintes.
1. Um sistema nacional de ensino superior
Face à procura social e à necessidade
de reforçar o “capital humano” como fator do desenvolvimento económico, a generalidade
dos estados modernos tem políticas de ensino superior, procurando garantir a
existência de uma rede institucional que satisfaça os objetivos definidos.
Interessa compreender bem o quadro onde estas políticas devem ser estruturadas.
A.
Para que serve o ensino superior.
A necessidade de dotar o estado de altos
quadros técnicos capazes de manter as suas burocracias foi reconhecida na idade
média europeia e manteve-se até aos nossos dias. Estas necessidades foram sendo
alargadas a funções técnicas exigidas pela industrialização e foram desembocar
no que hoje procuramos definir como sociedade do conhecimento. É reconhecido
que a existência de uma força de trabalho bem educada é crucial para o crescimento
económico e são as teorias do capital humano desenvolvidas a partir dos anos de
1950 que fundamentam o investimento crescente dos estados modernos na educação.
A educação é um fator crucial para o desenvolvimento, mas é insuficiente para,
só por si, produzir o almejado crescimento. Reconhece-se a necessidade de
dispor de um “mix” educativo equilibrado, quer nos níveis atingidos pelos
cidadãos (secundário profissional, superior, etc.), quer nas áreas de reforço
no percurso educativo (ciência e tecnologia, ciências sociais e humanas, artes,
profissões da educação, profissões da saúde, etc.). Um sistema nacional de
ensino superior deve ser capaz de responder harmoniosamente às aspirações dos
seus jovens (e adultos ativos) e de, na sua diversidade e flexibilidade, ter
capacidade de resposta a um futuro sempre muito incerto.
B.
Quem beneficia do ensino superior.
O beneficiário direto do ensino
superior é o próprio estudante mas, de forma indireta, toda a sociedade vai
beneficiar do exercício futuro das potencialidades por ele desenvolvidas. Do
mesmo modo, os erros de conceção do sistema educativo superior podem
refletir-se em custos futuros que podem ser importantes para toda a sociedade.
Mas as instituições de ensino superior têm hoje funções que vão muito para além
da educação. Elas representam um espaço de reflexão que, ao criar condições
para o desenvolvimento do potencial intelectual dos seus estudantes, representa
também um espaço de criação cultural e artística e de construção de novo
conhecimento científico. Tal como uma velha biblioteca, uma moderna instituição
de ensino superior detém o conhecimento de fronteira e deve disponibilizá-lo à
sociedade onde está inserida. Não vamos aqui desenvolver esta componente de
criação e difusão do conhecimento, mas ela assume um espaço crescente nas
sociedades modernas.
C.
Quem deve financiar o ensino superior.
Se aceitamos que os benefícios se
repartem entre o privado do estudante e o difuso que atinge toda a sociedade,
deveremos, idealmente, ser capazes de desenhar um modelo de financiamento em
que o estudante ou a sua família assumam a sua responsabilidade na medida das
suas possibilidades. Ao estado caberá assumir os custos ligados aos benefícios
difusos da importação e dispersão do conhecimento pela sociedade nacional.
Tradicionalmente, este desiderato era atingido em instituições públicas
(estatais ou de alguma corporação interessada no bem público) onde os
estudantes pagavam propinas que representavam custos subsidiados e encontravam
ainda um ambiente de vida social economicamente protegido. Com o
desenvolvimento dos estados sociais, especialmente nos anos de crescimento
rápido do pós-segunda guerra, a responsabilidade financeira deslocou-se mais
para o estado. Nos anos mais recentes há recuos significativos em muitos países
com os estudantes a assumirem uma cota crescente. O teste à validade desta
evolução tem sido posto na verificação de que todos os jovens para tal
preparados podem entrar no ensino superior, independentemente das condições
económicas das famílias.
D.
Que função está reservada ao estado.
O estado fica, no limite, com a função de
regulação, uma função de importância crescente na medida em que o impacto
nacional das políticas de ensino superior aumenta na proporção da participação
estudantil e dos baixos ganhos de eficiência que têm sido possíveis na educação
(em relação a outros setores de atividade). Se por um lado se fala mais do que
nunca de autonomia universitária, a intrusão dos organismos de controlo e
regulação é muito maior que no passado[3].
Mesmo sem participar nos custos, o interesse público de garantir a qualidade e
o prestígio dos graus académicos (porque estão muito para além da capacidade de
avaliação imediata do cliente, estudante ou empregador) implica uma forte
regulação estatal. Mas o estado é também o financiador direto ou indireto de parte
do ensino superior e, também por isto, é parte interessada. Como garante da
equidade do acesso de todos os jovens com potencial para terem sucesso num
percurso educativo superior, o estado é parte interessada no mecanismo de
financiamento. Esta garantia de acesso pode fazer-se por dois caminhos
alternativos, o financiamento direto do estado ao estudante (ou a garantia de
um empréstimo) ou uma política que leve a instituição de ensino superior a
aceitar os estudantes independentemente da sua capacidade de pagamento. Na
medida em que esta última alternativa seja aplicada, os custos da educação
serão desproporcionalmente assumidos pelos estudantes “mais ricos” que são
assim chamados a subsidiar os “mais pobres”. É o que acontece, até certo ponto,
em algumas universidades americanas, estatais ou privadas não lucrativas.
E.
Como se deve organizar o ensino superior.
A paisagem atual de ensino superior é
muito diversa. A exclusividade institucional pública é hoje rara, mas muitos
países europeus mantêm a iniciativa privada (lucrativa) limitada a algumas
áreas e com um peso frequentemente inferior a 20% do número total de
estudantes. Na maioria dos países europeus e norte-americanos houve
recentemente uma redução do financiamento público com efeitos relevantes no
aumento das propinas pagas pelos estudantes e nas condições de aprendizagem.
Estas dificuldades orçamentais têm levado à abertura ao “mercado privado” da
educação num percurso muito lento e prudente. Nos países europeus que saíram da
órbita da União Soviética e noutras regiões do mundo, instituições de ensino
superior empresariais têm uma cota importante. Em alguns países da américa
latina têm também considerável prestígio social, especialmente em áreas
profissionais de engenharias, direito e gestão onde podem atingir esse nível
sem grande esforço de investigação. Nos países onde se mantém um ensino público
gratuito ou muito subsidiado a par de uma ensino privado (não subsidiado), este
depende da incapacidade de resposta do setor público à procura crescente. Têm
sido notadas as distorções da oferta privada em favor de setores “de papel e
lápis” que podem ser mais lucrativos mas podem induzir desequilíbrios no
mercado de trabalho. A qualidade do sistema depende da capacidade de regulação
pelo estado ou por instituições independentes criadas pelo estado. Nos Estados
Unidos, onde a acreditação dos cursos é feita por entidades privadas, o governo
federal viu-se obrigado tomar medidas especiais para proteger os estudantes
mais carenciados de práticas abusivas para a obtenção de apoios federais[4].
Em resumo, a generalidade dos países
tem um sistema de ensino superior constituído por instituições públicas,
instituições privadas sem fins de lucro e instituições privadas empresariais. A
regulação pública é em geral muito forte quando o estado tem essa força para a
aplicar e controlar. Em muitos países, observa-se um crescimento do setor
empresarial, dependendo das condições de concorrência com as instituições
estatais.
2. Um ensino superior relevante
Todos os que participamos no ensino
superior reconhecemos o enorme progresso feito nos últimos decénios. Portugal
não foi exceção, mantendo um ritmo de crescimento anual médio de cerca de 6%
entre 1940 e o fim do século, acompanhando com algum atraso a generalidade dos
países europeus. O período de crescimento mais rápido foi a década de 1985-1995
onde recuperou o atraso sistemático que mantivera em relação à Espanha para
atingir níveis de participação comparáveis.
Figura
1.
Evolução do número de estudantes no ensino superior português entre 1940 e 2014
e comparação com a Espanha.
Note-se que nesta contagem não são
incluídos ainda os estudantes a frequentar os novos cursos TeSP (Técnico
Superior Profissional) de dois anos que foram criados em 2014. Os antigos CET
(Cursos de Especialização Tecnológica) com a duração de 1,5 a 2 anos não
satisfaziam as condições do EUROSTAT/OCDE para serem contabilizados como ensino
superior. Com a sua entrada em funcionamento pleno, teremos um aumento
previsível até 50.000 estudantes. Note-se que em Espanha e em França os cursos
equivalentes têm cerca de 300.000 estudantes inscritos. Mas a pressão
demográfica decrescente vai certamente fazer-se notar nos próximos anos, mesmo
que a participação no Ensino Superior continue a crescer, agora muito
lentamente. O ensino secundário profissional só se começou a afirmar no último
decénio e ainda há um caminho a percorrer. Com a obrigatoriedade do ensino até
aos 18 anos e na medida em que as vias profissionais demonstrem a sua
relevância pela empregabilidade, iremos provavelmente estabilizar em cerca de
50% da coorte nas vias académicas e 50% nas vias profissionais. Será este
percurso profissional que irá alimentar diretamente os TeSP que poderão assumir
também um papel muito importante na requalificação de ativos.
Mais difícil é discutir a relação entre
os percursos universitários e os percursos politécnicos em Portugal. Os
primeiros mantêm a preferência clara dos estudantes e da sociedade, mas esta
situação poderá estar a mudar rapidamente sob os nossos olhos. A preocupação
central dos estudantes e das famílias é hoje, não tanto “tirar um curso”, mas
seguir um percurso que garanta a empregabilidade. Na medida em que as
licenciaturas politécnicas estejam bem sintonizadas com as necessidades do
mercado de trabalho, elas poderão subir rapidamente na escala de preferência.
Temos hoje em Portugal cerca de 1/3 dos estudantes de ensino superior no
politécnico e 2/3 no universitário. Não seria surpreendente se a situação se
viesse a inverter a exemplo do que acontece na Holanda. A preocupação central
dos estudantes e das famílias é, já hoje, o da relevância do seu percurso
educativo superior. Esta é uma realidade com que as instituições terão de
aprender a viver.
Reconhecida a ambição de um número
crescente dos nossos jovens em chegar ao ensino superior, os responsáveis pelo
desenho e pela regulação do sistema terão de alimentar esse impulso enquanto
evitam a todo o custo que se instale a frustração entre estudantes e
diplomados. As expectativas são grandes porque vimos de sociedades onde o
prémio de ser licenciado era altíssimo. O título de Dr. ou Eng. foi, no século
XX, o sucedâneo do título nobiliárquico do liberalismo português do século XIX.
Temos de reconhecer que isso era um sinal de subdesenvolvimento e uma
consequência de termos desenvolvido tardiamente a educação. Mas é crucial que a
frustração não substitua o desinteresse ou o bloqueamento do passado.
Figura 2. “Raised but unrealistic expectations may lead to frustration and
revolution”,
Mariano Gago, OECD conference, Paris, 12 de setembro de 2012[5]
Idealmente, a frustração dos atuais
estudantes pode evitar-se oferecendo a cada estudante um desafio intelectual à
medida da sua ambição e do seu potencial. A frustração dos antigos estudantes
pode instalar-se se as suas expectativas e das famílias não puderem ser
concretizadas, especialmente se o tipo de atividade profissional que vão
exercer não lhes parecer ajustada ao esforço feito. Que pode fazer o regulador
do sistema de ensino superior para promover a relevância do ensino superior e
minimizar os riscos de frustração dos estudantes e diplomados?
Reconhecendo que os atuais estudantes
têm objetivos e ambições muito diferentes e vão desempenhar funções muito
diversas na sociedade, é importante oferecer um ensino superior suficientemente
diverso para que todos possam encontrar aí o seu caminho. Muitos quererão um
percurso rápido porque querem integrar-se rapidamente na vida ativa numa
posição interessante e mantendo aberta a possibilidade de reconstrução futura
do seu percurso educativo e profissional. Outros esperam que lhe proponham um
objetivo bem ambicioso que teste ao limite o seu potencial e que não os deixe
num nível inferior ao possível. Estudantes diferentes vão fazer escolhas
diferentes e nada mais frustrante do que ser a todos proposto um mesmo percurso
com sucesso assegurado. Sucesso imediato com diploma bem polido, mas inútil na
vida mais competitiva que os espera ao longo de uma longa vida profissional.
Tudo indica que será longa, não linear e nem sempre fácil. O percurso educativo
inicial não pode prometer tudo e não deve criar falsas expectativas de que tudo
vai ser fácil e previsível. O regulador vai garantir que existe uma barreira
ajustada à força muscular e à ambição de cada estudante. Que todos poderão
encontrar o seu caminho e ter aí sucesso. Nada pior que entregar a todos os
estudantes um diploma do mesmo formato, dizendo as mesmas coisas, criando as
mesmas falsas expectativas. Pior para os mais frágeis. Os melhor colocados
socialmente, não terão problemas, nada ganharão, e passarão adiante sem
dificuldade.
3. Um crescimento rápido em Angola[6]
A participação no ensino superior teve
em Angola um progresso notável nos últimos anos. De um nível muito abaixo da
média da África subsaariana há apenas dez anos, conseguiu já ultrapassá-la de
forma sustentada. É certamente a altura para fazer a avaliação do caminho
percorrido para fazer os ajustes que se mostrem necessários para oferecer um
melhor futuro aos seus jovens e à sociedade em geral. Como em todas as fases de
crescimento rápido, haverá que assegurar o reforço do corpo docente que
provavelmente é escasso e nem sempre seguirá os padrões internacionais. Os
países mais desenvolvidos e com sistemas de ensino superior mais reconhecidos
têm uma diversidade institucional que se manifesta nos corpos docentes. Na
Holanda, 2/3 dos estudantes de ensino superior frequentam instituições
politécnicas onde não há o requisito de doutoramento. Nos Estados Unidos, mais
de metade dos estudantes de ensino superior estão em Community Colleges onde, por norma, não há docentes doutorados. Os
cursos curtos (equivalentes aos TeSP portugueses) não usam docentes doutorados
em Espanha e França. Portugal tem tido dificuldade em manter uma saudável
diversidade institucional e algumas medidas recentes podem não ir no melhor
sentido, tomando a prática internacional mais comum como a norma. Um sistema
jovem deveria evitar copiar os erros e propor uma maior diversidade. Um sistema
de tipo institucional único é demasiado caro, serve mal os estudantes e terá
dificuldade em oferecer a diversidade de outros serviços que a sociedade
espera.
Figura 3
Comparação da taxa bruta de participação angolana no ensino superior com a
África Subsaariana[7]
Este crescimento muito rápido cria
certamente problemas, mas dá uma oportunidade única de modelar um sistema de
ensino superior suficientemente diverso, que sirva bem os estudantes e a
sociedade angolana e que possa ser sustentável no médio prazo. As dificuldades
orçamentais são comuns à generalidade dos países embora as razões possam não
ser coincidentes. Um regulador forte é importante para assegurar que o
voluntarismo natural nesta fase de implantação não deixe feridas difíceis de
curar.
Em muitos países a despesa nacional com
a educação e com a educação superior, em particular, são já elevadas pelo que
não é de esperar um aumento do esforço público e há limites ao que se pode
razoavelmente pedir às famílias. Nos países em desenvolvimento, a despesa por estudante
era muito alta, tendo baixado nos últimos anos em consequência do crescimento
da população estudantil. É necessário assegurar agora que esta quebra da
despesa unitária não se traduza num abaixamento da qualidade do ensino que terá
certamente ocorrido numa primeira fase. Só um ajuste mais lento da cultura
académica e das práticas de ensino podem garantir a qualidade.
Regista-se em muitos países a
insatisfação dos empregadores, embora este tipo de resultado tenha de ser
sempre tomado com alguma prudência. Em qualquer caso, o desajuste entre a
formação académica e a realidade do mercado de trabalho é um facto que se
manifesta finalmente em desemprego e subemprego e no desânimo dos jovens
diplomados. Estudos internacionais têm insistido[8]
na necessidade de encontrar uma linha de equilíbrio entre o rápido crescimento
e a relevância dos diplomados para a sociedade e assegurar a produção das
competências técnicas e a capacidade de investigação aplicada para promover
indústrias competitivas. A estratégia de financiamento do ensino superior terá
de privilegiar as áreas disciplinares que apoiam diretamente os objetivos
económicos nacionais.
Sistemas científicos nacionais terão de
ser reinventados através de incentivos financeiros e parcerias com o setor produtivo
para garantir a diferenciação institucional e assegurar um bom uso dos fundos
disponíveis e das pessoas mais preparadas para este trabalho criativo. As
agências de regulação têm um papel crucial no estímulo das melhores práticas e
na transparência que assegura a sua compreensão pública.
O modelo pedagógico poderá ter de ser
repensado para assegurar a eficácia da aprendizagem e a sua focagem na
resolução de problemas. A avaliação da aprendizagem feita através de projetos
individuais ou de grupos de estudantes tem de ser desenvolvida e é
particularmente difícil porque falta de experiência dos docentes. É seguramente
a parte mais difícil, onde o progresso lento só poderá resultar da persistência
de políticas de incentivo à inovação pedagógica. Métodos de ensino mais baratos
terão provavelmente de ser desenvolvidos usando a criatividade da comunidade
educativa e aproveitando as novas tecnologias.
4. Um modelo de financiamento sustentável
Face às enormes dificuldades de
financiamento que a expansão do ensino superior está a encontrar, temos de ser
realistas e experimentar todos os caminhos e ajustar o modelo institucional à
realidade de cada região. A maioria dos países tinha tradicionalmente um
importante financiamento público do ensino superior podendo ultrapassar 1% do
PIB, ou um pouco mais, a despesa pública alocada a este setor. Depois de se ter
universalizado o ensino básico e secundário, em geral totalmente financiado por
fundos público, não tem sido fácil acompanhar o crescimento da procura de
ensino superior. Alguns países sentiram-se mesmo obrigados e redefinir
prioridades preterindo o ensino superior na escala de prioridades da despesa
pública. Fontes alternativas assumem por isso uma importância crescente. A
alternativa ao pagamento de propinas mais altas pelas famílias dos estudantes é
a criação de sistemas de empréstimos com alguma forma de garantia pública. Esta
estratégia procura atenuar a aversão ao risco dos estudantes oriundos de meios
menos favorecidos, sem deixar de penalizar os rendimentos dos futuros
diplomados. É um sistema de pagamento diferido no tempo. Mas surgem
dificuldades, mesmo em países com sistemas fiscais bem desenvolvidos como a
Inglaterra e a Austrália onde sistemas públicos de empréstimos estão a ser
testados. As taxas de incumprimento são elevadas e a despesa pública pode vir a
crescer ao contrário da expectativa inicial. Outro problema é o incumprimento
dos diplomados que migram para o estrangeiro.
Uma fonte de financiamento muito
discutida é o fund raising. Com muita
tradição nas grandes universidades norte americanas, não tem impacto
significativo na generalidade dos países europeus e no resto do mundo apesar do
enorme esforço que tem sido feito nos últimos anos. Não pode ser desprezado e
será certamente importante em alguns setores de algumas instituições, mas não é
solução geral para o problema.
A prestação de serviços é uma última
categoria de receitas onde muitas instituições põem grande esperança.
Primeiramente, os serviços de investigação “não aplicada” são pagos com
subvenções públicas que representam mais de 50% das receitas de muitas
universidades, mesmo portuguesas. São uma componente importante da vida
financeira da universidade e permitem estimular o trabalho criativo dos
docentes, mas não são uma alternativa ao financiamento do ensino. Na Europa, o
financiamento da investigação é, em geral, a custos marginais, pelo que este
financiamento é prioritariamente usado diretamente nas atividades contratadas
podendo ainda exigir da universidade o pagamento de custos de estrutura,
pessoal equipamento e edifícios. Nos Estados Unidos, a tradição é financiar a
investigação a custos totais e isso permite às universidades mais bem
posicionadas manter estruturas de ensino com forte atividade de investigação.
Contratos com entidades privadas são, globalmente, menos importantes, mas têm
ainda um papel importante em alguns departamentos de algumas universidades.
Para algumas universidades europeias e
norte americanas, a fonte de receita da propriedade intelectual registada pelos
seus investigadores é importante. Por exemplo, o novo departamento de química
da Universidade de Oxford (Reino Unido) foi construído com fundos
disponibilizados por uma entidade bancária a troco de cerca de 50% das receitas
futuras de patentes registadas. É relevante, mas, em geral, esta receita não
ultrapassa uma pequena percentagem da despesa anual em investigação. Os
serviços prestados a empresas podem dar receitas muito interessantes, mas
raramente pagam a despesa total do serviço. Os sistemas nacionais de inovação
estão em geral desenhados para que estes serviços sirvam de estímulo à inovação
empresarial ou, mais explicitamente, de subsídio à inovação empresarial. No
fundo a universidade canaliza fundos público para a inovação empresarial.
Em resumo, o ensino é em geral
financiado pelo estado e pelas famílias. As receitas importantes obtidas de
serviços de investigação enriquecem o ensino, mas dificilmente podem ser vistos
como dando um apoio ao seu funcionamento básico. Talvez a exceção mais notável
sejam as universidades australianas onde é política nacional assumida a atração
de estudantes internacionais como meio de financiamento do ensino superior dos
nacionais. Esta mesma situação existe nos grandes países atractores de estudantes
internacionais como o Reino Unido e os Estados Unidos, mas o seu impacto
relativo é muito menor. A maioria dos países com políticas de atração de
estudantes internacionais têm em geral outro objetivo (não assumido), a
importação de cérebros a forma de imigração mais rentável, para além da
preocupação de manter um nível saudável de exposição dos seus jovens a outras
culturas e mundividências.
Porto, 28/agosto/2016
[1] Apresentado
na Conferência sobre o Financiamento do Ensino Superior, 1-2 de setembro de
2016, Centro de Conferências de Belas, Luanda, promovida pelo Ministério do
Ensino Superior e pela Fundação Sagrada Esperança.
[2] Apresentado na Conferência sobre o Financiamento do Ensino Superior, 1-2 de
setembro de 2016, Centro de Conferências de Belas, Luanda, promovida pelo
Ministério do Ensino Superior e pela Fundação Sagrada Esperança.
[3] Geoffrey
Alderman, Times Higher Education Supplement, 9 de Junho de 2016: “The HE bill
will sweep away self-regulation of standards. Whose fault is that? The Office
for Students will kill off institutional autonomy, says Geoffrey Alderman, and
the sector has only itself to blame”.
[4]
Financial Times, 9 de fevereiro de 2016, “Obama targets
illegal behaviour in higher education sector”,
https://next.ft.com/content/aafeb88c-ce92-11e5-92a1-c5e23ef99c77#axzz3zqQsXE3y
[5] “Reinventar-se
para servir melhor uma visão prospetiva do ensino superior”, José Ferreira
Gomes, Universidade do Porto, Abril de 2016, em "Pensar o Ensino Superior
e a Ciência: O Conhecimento e a Tecnologia Rumo a 2050 - Um Exercício de
Prospetiva", uma edição do SNESup.
[6] Conhecendo
mal a situação em Angola, os meus comentários advêm da observação da evolução
feita em Portugal no último meio século e também noutros países em crescimento
rápido.
[7] Dados
do Banco Mundial, http://data.worldbank.org/indicator/SE.TER.ENRR?locations=AO, consultado em Agosto de 2016
[8] W.
Saint, “Tertiary Education and Economic Growth in Sub-Saharan Afric: The World
Bank Report”, International Higher Education,
http://ejournals.bc.edu/ojs/index.php/ihe/article/view/8417
Para um Ensino Superior Relevante e Sustentável - Resumo
José Ferreira Gomes
Faculdade de Ciências, Universidade do
Porto
Resumo:
O acesso ao ensino
superior é a aspiração de um número crescente de jovens em muitas regiões do
mundo, sendo já concretizado, em alguns países, por mais de 50% da população jovem.
Nos países mais ricos, o crescimento do acesso deu-se, gradualmente, na segunda
metade do século XX. No virar do milénio a expansão do acesso tornou-se uma
preocupação política em quase todas as regiões do mundo e uma forte aspiração
da generalidade dos jovens crescendo em ambiente urbano. Esta realidade criou
enormes tensões no financiamento, mas também na qualidade do serviço educativo
prestado e na sua relevância para a sociedade. O esforço político de reforma
dos sistemas de ensino superior tem sido uma preocupação permanente na
generalidade dos países, sendo os temas dominantes (1) a qualidade académica do
ensino, (2) a relevância social dos cursos propostos, (3) a empregabilidade dos
diplomados e (4) o financiamento das instituições. O problema social do
desemprego e do subemprego de diplomados é uma nova realidade nas preocupações
políticas de muitos governos em todos os continentes.
Com a massificação
do acesso ao ensino superior, tornou-se necessário diversificar a oferta.
Enquanto que, tradicionalmente, os diplomados do ensino superior se destinavam
à burocracia do estado e a algumas poucas profissões liberais, eles dirigem-se
hoje prioritariamente para o setor privado e para funções muito diversas. As
instituições de ensino superior têm tido dificuldade em responder a esta nova
realidade. Os estudantes e as famílias parece tomarem as suas opções no antigo
quadro de organização social, criando expectativas impossíveis de realizar.
Esta uma das causas possíveis para os problemas sociais conhecidos em países
com histórias de ensino superior muito diferentes. Os governos têm procurado
incentivar uma maior diversificação através da diferenciação institucional
entre universidades e politécnicos. A perceção social desta nova realidade é um
processo muito lento, mas há iniciativas de reforço em resposta às necessidades
sociais reconhecidas. Atualmente, podemos identificar pelo menos três tipos de
percurso inicial no ensino superior em muitos países onde este percurso foi
iniciado mais cedo. (1) Cursos curtos de 2 anos de cariz muito profissional e
de perfil estreito com vista à entrada imediata no mercado de trabalho. (2)
Cursos tipicamente de 3 anos (licenciatura) com ênfase na vertente profissional
com uma boa base teórica, mas focada no objetivo definido; a continuação de
estudos é possível, mas quase sempre exige um esforço adicional de reforço das
bases concetuais. (3) Cursos de 3 anos (licenciatura) desenhados para a
continuação de estudos em mestrado (2 anos), embora se procure criar condições
para a alternativa de entrada imediata no mercado de trabalho deixando ao
estudante o esforço de adaptação ao posto de trabalho por que venha a optar. O
mestrado é visto como um aprofundamento e aplicação dos conhecimentos
adquiridos para o domínio de uma área de conhecimento e para o exercício
profissional autónomo nas áreas tecnicamente mais avançadas. Outros mestrados
podem ter o papel de especialização ou de reorientação profissional de ativos.
Muitos países e muitas instituições de ensino superior insistem de forma
crescente na interação do estudante com alguma atividade profissional
(estágios) para facilitar a transição e ajudar o estudante a fazer a sua
escolha de percurso educativo.
Tradicionalmente, as
instituições de ensino superior desenvolveram-se na forma de universidades públicas
ou privadas sem fins de lucro e esta é ainda a realidade dominante na Europa Ocidental
e na América do Norte. Nos anos mais recentes, a iniciativa empresarial tem um
papel crescente em muitos países, o que colocou problemas novos à regulação
pública da educação superior. A dificuldade resulta da grande imperfeição do
mercado educativo por o “cliente” não ser capaz de avaliar a qualidade
do serviço que vai comprar; na melhor das hipóteses, poderá avaliar esta
qualidade décadas depois de completado o processo educativo. Embora sejam
reconhecidas as externalidades positivas, o acesso ao ensino superior tem
benefícios pessoais muito significativos que justificam a participação dos
jovens e das famílias no seu financiamento. Apesar de ainda haver alguns países
europeus com ensino superior gratuito (sem propinas), a partilha dos custos com
participação crescente das famílias é hoje a norma. Nos países em
desenvolvimento, o retorno privado da educação superior é, em regra, muito
elevado e o custo de um curso tende a ser muito alto quando expresso em
unidades de PIB per capita. Esta
realidade cria problemas mais severos ao financiamento público e justifica a
maior participação das famílias. A exigência de participação das famílias no
financiamento, exige sempre algum sistema de apoio público aquelas que não têm
condições económicas para o fazer. Só assim é possível assegurar a equidade no
acesso e se pode esperar o aproveitamento pleno do potencial intelectual dos
jovens para participarem no desenvolvimento social e económico. Estes sistemas
de apoio representam um esforço financeiro significativo por terem de apoiar
mais de 25% dos estudantes e não ser fácil estabelecer e aplicar critérios
justos para a definição do estado de carência. A alternativa de transferir o
custo da educação para o estudante através de um empréstimo a pagar no futuro
foi defendida por alguns peritos e está em aplicação em alguns países, mas têm
surgido problemas graves de sustentabilidade, mesmo em países como a
Inglaterra.
[1] Apresentado
na Conferência sobre o Financiamento do Ensino Superior, 1-2 de setembro de
2016, Centro de Conferências de Belas, Luanda, promovida pelo Ministério do
Ensino Superior e pela Fundação Sagrada Esperança.
Morte aos vocacionais?
Morte aos
vocacionais?
[In Público, 1 de junho de 2016]
Todos os países desenvolvidos
fazem esforços para aumentar a relevância do seu ensino básico, secundário e
superior. O desemprego jovem que aflige a generalidade das sociedades
desenvolvidas cria uma enorme pressão para que se apoie a transição entre a escola
e a vida ativa. Em Portugal, depois de um esforço iniciado há pouco, vamos novamente
experimentar outro caminho. Afastamos novamente os jovens do contacto com os desafios
e a vivência de um posto de trabalho e prometemos reforçar o apoio escolar apenas
dentro da sala de aula!
Apesar dos notáveis
progressos conseguidos nos últimos anos, Portugal tem ainda um abandono escolar
precoce elevado. Os progressos conseguidos devem-se às escolas que tão bem têm
vindo, progressivamente, a melhorar a experiência educativa dos seus alunos. As
escolas têm certamente de continuar e ir mais longe no apoio a todos os alunos
e, em especial aos que tenham dificuldades ou que queiram ajustar o seu
percurso ao longo do básico e do secundário. Mas o que o Ministro da Educação
promete, agora, é outra coisa bem diferente, é uma cortina de fumo para ofuscar
a discussão do regresso do ensino obrigatório à via única que tão maus
resultados deu no passado. Podemos admitir que a intenção é muito nobre mas a
ignorância das suas consequências, já tão bem conhecidas, é indesculpável. É
ignorar um passado de quase meio século de esforços para levar todos os alunos
mais longe no seu percurso educativo!
Todos conhecemos o atraso da
escolarização dos portugueses. Ao fim de 42 anos de democracia, nem todas as
culpas podem ser assacadas à história. É verdade que Fontes Pereira de Melo deu
prioridade absoluta aos “melhoramentos materiais” esquecendo totalmente a
educação. É verdade que a Primeira República não teve dinheiro para levar por
diante todas as boas intenções que apregoou. É verdade que o Estado Novo
acertou as contas públicas à custa de uma fortíssima contenção em todos os
sectores do estado, incluindo a educação.
É verdade que até à chegada de Veiga Simão, no governo de Marcelo Caetano, o
ensino obrigatório se limitava a 4 anos e que as nossas cidades, vilas e
aldeias ainda estavam marcadas pelos dois surtos construtivos de escolas
primárias, o primeiro devido ao legado do Conde de Ferreira (1866) e o segundo para
a celebração nacionalista dos centenários (1940). Apesar do grande investimento
feito nas últimas décadas, o abandono escolar precoce manteve-se teimosamente
alto. Entre 1992 e 2002 não houve ganhos significativos com o abandono escolar
precoce que a manter-se entre os 45% e os 50%. Depois disso surgiram finalmente
resultados com uma queda ao ritmo de 9% ao ano.
É verdade que não temos cá a sociedade
e a escola finlandesa, mas temos, sem dúvida, muitos professores excelentes na
sua dedicação à profissão docente. Não deve estar aqui, na falta de dedicação,
a causa do nosso atraso. Apesar do grande investimento feito no último meio
século para acolher os 9 anos (agora 12 anos) de escolaridade obrigatória,
muitos edifícios pediam já insistentemente uma renovação que só recentemente
foi quase completada mas ninguém pensa que seja esta a causa do mau desempenho.
Com uma despesa nacional a 4,5% do PIB, bastante acima da média da OCDE (e dos 3%
em Espanha), também não pode ser assacado à falta de recursos o mau desempenho
do sistema de ensino básico e secundário. Resta-nos procurar a explicação em
erros de política educativa ou de organização do sistema educativo.
Passos Manuel, no preâmbulo
do decreto de 1836 de criação do ensino liceal, fala no primeiro
protesto oficial contra a instrução secundária exclusivamente clássica e
formal. A realidade não cumpriu este desígnio com um
ensino liceal a tender para uma via muito académica sempre focada na
continuação de estudos. Num esforço para evitar a segregação social no percurso
educativo, as escolas técnicas foram extintas em 1974 optando-se por um
percurso escolar único. Apesar de sucessivamente criticado por muitos ministros
da educação, e apesar do grande contributo que as escolas profissionais (na sua
maioria de iniciativa privada) iniciaram em 1988, só 30 anos mais tarde foram
criados nas escolas secundárias cursos tecnológicos e cursos profissionais como
alternativa aos cursos científico-humanísticos, estes vocacionados
exclusivamente para o prosseguimento de estudos. Esta inovação legislativa de
2004 introduziu uma alteração profunda na vida das escolas e nas expectativas
dos alunos. Os efeitos no abandono escolar começaram a ser visíveis apesar da
dificuldade em manter a motivação e evitar o abandono dos alunos dos cursos
profissionais. Ao alargar a escolaridade obrigatória até aos 18 anos foi
preciso ir mais longe na diversificação da resposta. Os cursos vocacionais
demonstraram já o seu potencial para atenuar o abandono e levar mais jovens a
terminar o ensino obrigatório com um diploma reconhecido no mercado de
trabalho.
Segundo as estatísticas mais recentes
(2013-14), 34% dos alunos do ensino secundário seguem as vias profissionalizantes
e mais de 11% seguem percursos alternativos, designadamente, cursos de aprendizagem,
educação e formação e vocacionais. No terceiro ciclo do ensino básico, temos
cerca de 10% em percursos alternativos ao ensino geral. Estas opções são menos
significativas no primeiro e no segundo ciclo. Para baixarmos o abandono temos
de continuar a melhorar a oferta no segundo e terceiro ciclos onde se perdem
hoje muitos alunos (ainda que menos do que há uns anos atrás) que não encontram
resposta adequada no ambiente oferecido pela escola. Melhorar significa acolher
a realidade dos alunos que procuram cada escola e levá-los tão longe quanto
possível na satisfação da sua ambição e na estruturação de uma personalidade
bem integrada na sociedade. Em muitos casos, a escola e cada professor terão de
encontrar um espaço de diálogo eficaz para a construção de um percurso pessoal para
cada estudante. São estes percursos pessoais que levam todos ao sucesso!
Os cursos vocacionais têm em
2015-16 cerca de 28 000 alunos e oferecem mais uma proposta a muitos estudantes
que na iniciação a uma atividade profissional encontram o seu espaço de
realização pessoal. Os alunos são muito diversos na sua personalidade e na sua
ambição e objetivos. A escola tem de saber dar a melhor resposta a essa
diversidade. Não há certamente um modelo único que possa satisfazer todos os
jovens.
É bem conhecido o problema da
escola no acompanhamento das escolhas dos seus alunos e a necessidade de um
grande esforço para que essas escolhas não sejam influenciadas negativamente
por preconceitos dos agentes escolares. Mais ainda, todas as escolhas devem
poder ser revistas pelo aluno quando ele queira pôr o esforço adicional
possivelmente necessário para retomar outro percurso. Este apoio à reconstrução
dos percursos educativos é da responsabilidade da escola que tem de saber lidar
com as incertezas da adolescência e estimular cada estudante a encontrar o seu
percurso de sucesso pessoal. São precisos os meios e a organização local da
escola para a construção destas respostas. O apoio adicional aos alunos não é,
nem se pode colocar como uma alternativa à proposta de cursos vocacionais para
os alunos que reconheçam ser esta a sua melhor opção.
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